quinta-feira, 11 de março de 2010

DIÁLOGOS NA CÂMARA - XI

Via-se que o presidente estava bem disposto e isso tranquilizou o vice-presidente.

- Sabe, meu caro, estes últimos dias têm me trazido boas notícias - disse, com um sorriso aberto, o presidente.

- Pois é, senhor presidente, o nosso candidato têm boas condições para ser eleito o novo líder do partido e isso vai ser bom para si. - respondeu o vice-presidente.

- Não, não é nada disso. Para mim seja qual for o que ganhe eu depois lá lhe darei a volta. Digo-lhe mesmo que não quero que andem para aí dizer que eu apoio A ou B. Pode haver alguma surpresa e não merece a pena criar anti-corpos - retorquiu o presidente.

- Mas então quais são as boas notícias de que o senhor presidente fala? - perguntou o vice-presidente.

- Olhe, então não ouviu que vão adiar a construção do TGV entre Lisboa e o Porto? - disse, enfaticamente, o presidente, e acrescentou - Eu sempre estive de acordo com as cinco linhas do TGV, que em tempos o nosso governo acordou com Espanha, também concordei com as soluções em T e em H, acabei por achar que o melhor era a linha Lisboa-Madrid e Lisboa-Porto/Galiza mas agora digo-lhe, com franqueza, que a boa solução é apenas a linha Lisboa-Madrid.

- Mas, senhor presidente, isso não só parece uma posição pouco coerente como prejudicial a Coimbra - atreveu-se o vice-presidente.

- Nada disso. Veja bem. O TGV é um transporte rápido e flexível tal como eu, que também sou flexível  e rápido nas minhas posições e depois para Coimbra a sua construção é que seria muito prejudicial - afirmou o presidente.

- Sinceramente não entendo, senhor presidente - assumiu, hesitante, o vice-presidente.

- Pense bem, meu caro. Se o TGV Lisboa-Porto avançasse ia haver obras em Coimbra e iam destruir a estação de Coimbra B, não é verdade? E não vê a perturbação e a confusão que isso seria!? Quer-me acabar com o sossego, no tempo que ainda por aqui vou estar? E, depois, como é que construíamos a ciclovia até a Figueira? Não vê o transtorno que as obras do TGV traziam a esse grande projecto? Por outro lado uma nova estação ferroviária em Coimbra ia alterar irreversivelmente a fisionomia da cidade e isso não é bom.  Já viu a tristeza que era acabar com o actual túnel e com a funcional praça de táxis que são verdadeiros ex-libris da cidade. Nós temos história e tradição e temos de as manter! - sublinhou, em tom decidido, o presidente.

- Senhor presidente desculpe,  mas não posso estar de acordo consigo - assumiu corajoso o vice-presidente.

- Pois é, eu bem os conheço. Mal têm uns meses de mandato começam logo a ter ideias. Serene esses seus entusiasmos. Não vê que estas coisas são para levar com calma e sem confusões. Eu, por exemplo, quando  qualquer dia for para Lisboa e quiser ir a Madrid não vou ter problema nenhum. A única coisa que me deixa um pouco triste é que sem o TGV e a nova estação não vai haver um novo centro comercial e isso é que uma pena. É que, como tenho afirmado, a modernidade da cidade passa pelos centros comerciais e eu quero deixar  uma herança de grande modernidade à cidade...

O vice-presidente manteve-se silencioso. Não se percebia se o dilema interior com que se debatia tinha a ver com o tipo de bitola a usar pelo TGV ou com qualquer outra razão.
 
Nota: Qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência.

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