sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

A ARTE DA PRUDÊNCIA - 79


 Carácter jovial.

Com moderação, é uma qualidade e não um defeito. Um pouco de graça a tudo dá sabor. Os homens maiores também movem a peça do donaire, que atrai a estima de toda a gente. Mas respeitando a prudência e guardando o decoro. Outros fazem de uma graça o atalho para sair airosamente de um problema, pois há coisas que devem levar-se na brincadeira, mesmo aquelas que, por vezes,  o outro leva mais a sério. Indica aprazibilidade e é um encantamento para os corações.

A Arte da Prudência
Baltasar Gracián


quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

PREVISÕES


Não me recordo de nas previsões astrológicas para 2010 ter havido videntes suficientemente competentes para adivinhar o tão vasto naipe de acontecimentos que tiveram lugar, neste ano, em Coimbra.

Pelo menos não me recordo do anúncio, por força da conjugação astral ou das cartas do tarot, de três grandes derrotas que marcaram o ano. A primeira, a do Metro Mondego, pela impotência demonstrada por Coimbra perante o abandono do projecto pelo governo. A segunda, a do Dr. Carlos Encarnação, em fuga da Câmara, num ataque de pânico, face  à consciência das consequências desastrosas da sua gestão. Finalmente a do PS a nível distrital, paralisado pela derrota dum vencedor imposta pela vitória do vencido.

Primeira conclusão: é difícil fazer previsões para Coimbra!

Pode-se e deve-se, apesar disto, ter uma visão prospectiva para Coimbra, ainda que de curto prazo, e tentar equacionar um cenário que, à luz dos elementos existentes, é de óbvia anarquia paralisante, com a Câmara a caminhar simpaticamente para o caos, os principais partidos políticos com objectivos baralhados e as câmaras de vigilância entretidas com uma Baixa cada vez mais vazia e abandonada.

Segunda conclusão: é fácil fazer previsões para Coimbra!

De acordo com estas conclusões, e sem ser necessário deitar os búzios, é possível prever que em Coimbra, em 2011, continuará a faltar uma liderança forte, um discurso ético consequente e uma acção política determinante à sua defesa e desenvolvimento.

Restamos nós, que este ano não temos procissão da Rainha Santa, a lavar as nossas mágoas na certeza de que nos falta cada vez mais futuro e nos sobra cada vez mais mediocridade.
 

INGRATIDÃO


Diz-se, e com razão, que em política não há gratidão.

No entanto há momentos em que seria da maior justiça expressar publicamente alguma gratidão por comportamentos políticos particularmente relevantes, para mais em tempos de fraternidade natalícia.

Vejamos. Não seria bonito a CDU ou o PCP, é absolutamente indiferente, agradecer publicamente ao Dr. Carlos Encarnação todas as atenções recebidas durante a sua presidência na Câmara de Coimbra. Cooperaram estrategicamente, nadaram juntos, politicaram juntos, tendo inclusivamente a CDU ou o PCP, é absolutamente indiferente, recebido "pendão e caldeira" do ex-presidente da Câmara, que agora viu partir sem um furtivo agradecimento que fosse por tudo o que um verdadeiro "compagnon de route" lhe deu?!

É, aliás estranho este silêncio quando há uns anos atrás a CDU ou o PCP, é absolutamente indiferente, se fez representar por um seu vereador numa sentida homenagem a um ex-governador civil do PSD que, por coincidência era o mais encarniçado opositor do metro e que hoje, em tempo de expectativas no seu PSD, sobre um futuro candidato à Câmara de Coimbra, assume uma tonitruante  liderança motorizada a favor do metro. Como são as coisas!

Por outro lado não teria sido bonito ver o Dr. Carlos Encarnação agradecer ao Dr. Victor Baptista os preciosos contributos estratégicos e práticos que deu para a sua eleição, para a sua reeleição e para a sua misteriosa gestão autárquica?!

Em política diz-se, e com razão, que não há gratidão, mas não há nada que diga que não deve haver memória.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

FESTA DE DESPEDIDA


Confirmando o boato de que a demissão do presidente da Câmara de Coimbra foi precedida de um concerto natalício, pela coesa equipa que o acompanhava, aqui fica o registo, para memória futura, desse memorável momento.



Nota: A publicação deste vídeo, que me foi simpaticamente enviado, não é mais do que uma homenagem singela aos protagonistas que, a partir deste Natal, vão deixar de tocar juntos. Estou certo que o vão apreciar com fair-play.

domingo, 19 de dezembro de 2010

UMA BEATIFICAÇÃO COMPROMETIDA E UM PRESIDENTE SEM LEGITIMIDADE POLÍTICA


Na sequência da operação mediática de desculpa e martírio realizada pelo demissionário presidente da Câmara de Coimbra é inevitável que o Prefeito da Congregação para a Causa dos Santos seja chamado a abrir um processo de beatificação.

Ao tão vasto sofrimento, que foi amplamente exposto, falta tão só que agora que sejam conhecidos alguns "milagres" para que venhamos a ter mais um "beato" em Coimbra, e logo numa área tão desacreditada como a política.

Como em 1983 foi abolido o Advogado do Diabo,  tudo será, porventura, célere, apesar das dificuldades que se irão levantar quando o titular do processo iniciar a sua investigação porque o "mártir" demissionário presidente começa por se justificar com a má vontade governamental  contra a sua gestão da cidade quando, logo em 2002, é ele que faz o grande apelo público, quando aquele decidiu acabar com o Museu da Ciência e da Técnica: "Deixem governo governar!".

Depois queixa-se da falta de investimento e da atenção do governo quando foi ele próprio que amputou e estrangulou o PólisCoimbra, que era apoiado pelo governo. Acabou com o projecto "Estações com Vida", argumentando que a Estação Nova não podia ser o Fórum Cultural Miguel Torga, que estava previsto. Clamou contra o Euro 2004 e as obras no Estádio, apesar de o ter inaugurado por três vezes e ter gasto milhões de euros num novo Estádio em Taveiro. Mais ainda, aprovou um "espantoso" processo EuroStadium para salvar as finanças municipais, cujos resultados só Deus conhece...

Também, o bondoso instrutor do processo de beatificação, encontrará, nas alegações do "mártir" demissionário presidente, um conjunto de contradições tão vastas e tão evidentes que se sentirá confuso. Olhará  para a voragem despesista que protagonizou, com despesas correntes e a contratação de "pessoal", que o deixará confuso, porque ao mesmo tempo reduzia drasticamente as verbas para a cultura e acusava os agentes culturais de amiguismo...

Contristado o instrutor olhará para outra relevante afirmação de que com a sua saída, diz o "mártir" demissionário presidente, haverá mais coesão no Executivo municipal, quando este tanto trabalhou para essa coesão correndo com diversos dos "seus" vereadores em nome de uma uma unidade política e de acção coesa por parte da maioria que encabeçava. Aliás talvez o argumento da coesão tenha mais a ver com uma questão de poder pessoal e absoluto vazio de visão e estratégia para uma cidade que colocou à deriva.

Por outro lado, o perplexo instrutor, sentirá o drama de saber que o "mártir" demissionário presidente foi eleito contra a co-incineração e ela é um facto e que chegou à Câmara depois de uma afirmada convicção de que era contra o Metro e agora diz que se demite porque não vai haver Metro...

Também lerá, o instrutor do processo, que o "mártir" demissionário presidente deu à estampa, com pompa e circunstância, um livro com o título "O Poder é Solúvel", quando um primeiro ministro se demitiu, em condições políticas particularmente difíceis e agora, num quadro de estabilidade política, apoiado por uma maioria absoluta vê o "mártir" demissionário presidente fugir ao compromisso assumido com os cidadãos de Coimbra. Neste caso o poder é mais do que solúvel...

O mesmo instrutor acabará por se arrepiar com a grosseira violação da ética política, através a nomeação do presidente de um clube de futebol para tutelar a área do urbanismo dando azo a um conjunto de suspeições e de processos judiais como nunca tinha acontecido na Câmara de Coimbra.

Nesta altura o instrutor do processo  começará a pensar na afirmação de Luigi Pirandello "Os facto são como os sacos; quando vazios não se têm de pé." e ficará na dúvida se no meio disto tudo os "factos" apontados pelo "mártir" demissionário presidente não passarão de um monte de nada.

Aliás o instrutor do processo de beatificação temerá se as redundantes justificações de fuga não terão mais a ver com a consciência do "mártir" demissionário presidente que conduziu a Câmara de Coimbra ao descalabro financeiro, à irrelevância política e ao descrédito ético e ao medo de tudo o que vai acontecer em 2011, nomeadamente falta de dinheiro para o essencial, eventual condenação do "seu" ex-director municipal do urbanismo, etc., etc., etc...

Por isto e por muito mais é natural que um desejado processo de beatificação, pelo "mártir" demissionário presidente, acabe comprometido, até porque a sua fuga não vai dar azo a qualquer milagre mas quase certamente a uma instabilidade e confusão que não vai salvar ninguém. É que agora vamos ter um saco de gatos instalado na Câmara, para mais com um presidente de Câmara a quem falta legitimidade política para travar os combates do futuro de Coimbra.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

A ARTE DA PRUDÊNCIA - 78


Começar com pés de chumbo.

A Necedade surge sempre de roldão, pois todos os néscios são audazes. A sua estupidez, que inicilamente os impede de se aperceberem dos inconvenientes, anula-lhes depois o sentimento de fracasso. Mas a Prudência surge com grande tento. Os seus batedores são a Observação e a Cautela; elas vão abrindo caminho para passar sem perigo. Qualquer acção irreflectida será condenada ao fracasso pela Disicrição, embora por vezes seja salva pela Sorte. Convém andar com cuidado onde se teme que a profundidade seja grande; que o prepare a Sagacidade e que a Prudência vá ganhando terreno. Há hoje muitos baixios no trato humano e convém ir sempre com a sonda na mão.

A Arte da Prudência
Baltasar Gracián

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

HÁ COISAS QUE SÓ ACONTECEM AQUI


Há coisas que só acontecem em Coimbra e que por isso a tornam uma cidade tão especial.

Por exemplo: as iluminações de Natal sendo uma iniciativa comum, por esse país fora, em Coimbra têm dado azo a episódios, no mínimo, interessantes.

Quem não se lembra da inauguração das iluminações da Natal em 2002,  com o presidente da Câmara a accionar o interruptor no Largo da Portagem num princípio de tarde, ainda dia, e o lançamento simultâneo de fogo de artificio na margem esquerda, para anunciar as iluminações, sem que ninguém percebesse o que se estava a passar nem tão pouco conseguisse ver os previstos efeitos pirotécnicos, até porque ainda era de dia.

E quem não se recorda da presença vigilante, em vários anos, durante o tempo das iluminações natalícias, de um escadote que se perpetuava na Portagem, levando a que quem chegava a Coimbra, por aquelas alturas, ficasse "maravilhado", imaginando uma performance natalícia à volta de um escadote. Muitas serão as fotografias por esse mundo fora do icónico escadote conimbricense, plantado num dos seus espaço mais imagéticos.

Mas chegámos a 2010 e nova surpresa estava guardada. Como é curial nas iluminações natalícias há uma temática habitual em que as figuras do Presépio assumem um papel central, delas partindo rastos de luz e desenhos com figuras estereotipadas, para iluminar as ruas mais comerciais.

Pois bem, este ano em Coimbra temos uma situação divertida. No Largo da Portagem, local donde  emanam  as iluminações de Natal para a Baixa da Cidade, o elemento central é, nem mais nem menos, a estátua de Joaquim António de Aguiar. Como se pode ver Joaquim António de Aguiar aparece no seu pedestal como pináculo de uma abóbada que os efeitos natalícios elegem como elemento de referência. 


É uma "homenagem" a um filho da terra pensarão alguns, particularmente os visitantes. Na verdade, Joaquim António de Aguiar é um filho ilustre de Coimbra, que desempenhou relevantes funções públicas a nível nacional. O curioso é que por força  da sua acção política acabou por ficar conhecido no país como o Mata-Frades. 

Como se constata há coisas que, verdadeiramente, só acontecem aqui. O Mata-Frades é o "rei" do Natal conimbricense!

Claro que para o ano, por esta altura, haverá decerto, por aqui, outras curiosidades. É muito provável, por exemplo, que já exista Secretariado da Federação de Coimbra do PS, que o novo Hospital Pediátrico já tenha sido inaugurado e até que ainda exista a Sociedade Metro Mondego, com o respectivo conselho de administração a enviar postais de Boas Festas e a gerir os autocarros que transportam os presuntivos utentes dum metropolitano que não existe e que nunca mais irá existir. 

E até há quem acredite que, nessa altura, o PS - partido que apoia o governo - ainda peça a demissão do Secretário-de-Estado dos Transportes, contra a vontade do presidente da Câmara, importante membro do principal partido da oposição ao governo, que não quer dar para esse peditório. Vejam lá como são as coisas...

Não se esqueçam meus amigos, Coimbra é uma cidade surpreendente. Há coisas que só acontecem aqui...

domingo, 5 de dezembro de 2010

A ARTE DA PRUDÊNCIA - 77

Saber adaptar-se a todos.

Ser um discreto Proteu: douto com o douto e santo com o santo. É a grande arte de a todos conquistar, porque a semelhança atrai a simpatia. Observar o carácter e adaptar-se ao de cada um. Ao sério e ao jovial seguir-lhes a corrente, transformando-se delicadamente. É necessário àqueles que dependem de outros. Esta grande destreza para viver exige uma grande capacidade. É menos difícil para o homem de muita cultura e de gosto amplo e agradável.

A Arte da Prudência
Baltasar Gracián

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

YOUKALI

Por muitas razões, este é um bom dia para ouvir Ute Lamper cantar Kurt Weill e, particularmente, aquele belíssimo tema, com letra de Roger Fernay: Youkali - uma ilha especial e encantada.

Youkali

É quase no fim do mundo
Que meu barco errante
Vagueando pelas ondas
Me conduziu um dia
A ilha é pequena
Mas a fada que lá vive
Gentilmente nos convida
A um passeio por ali

Youkali
A terra dos desejos
Youkali
A alegria, o prazer
Youkali
É o lugar onde esquecemos os problemas
É em nossa noite como uma fresta de luz
A estrela que seguimos
É Youkali

Youkali
É a honra dos juramentos perdidos
Youkali
A terra do amor correspondido
É a esperança
Que há em todo coração humano
A libertação do que esperamos para o amanhã

Youkali
A terra de nossos desejos
Youkali
É alegria, é prazer
Mas é um sonho, uma insensatez
Não há
Youkali

DIA DE NATAL


Fez há dias anos que nasceu Rómulo de Carvalho - 24 de Novembro de 1906. António Gedeão nasceu mais tarde e morreu mais cedo.  Relembrando-os e porque o Natal se aproxima, aqui fica de António Gedeão:

Dia de Natal

Hoje é dia de ser bom.
É dia de passar a mão pelo rosto das crianças,
de falar e de ouvir com mavioso tom,
de abraçar toda a gente e de oferecer lembranças.

É dia de pensar nos outros - coitadinhos - nos que padecem,
de lhes darmos coragem para poderem continuar a aceitar
a sua miséria, de perdoar aos nossos inimigos, mesmo aos
que não merecem,
de meditar sobre a nossa existência, tão efémera e tão séria.
Comove tanta fraternidade universal.
É só abrir o rádio e logo um coro de anjos,
como se de anjos fosse,
numa toada doce, de violas e banjos,
entoa gravemente um hino ao Criador.
E mal se extinguem os clamores plangentes,
a voz do locutor
anuncia o melhor dos detergentes.

De novo a melopeia inuda a Terra e o Céu
e as vozes crescem num fervor patético.
(Vossa Excelência verificou a hora exacta em que o Menino
Jesusu nasceu?
Não seja estúpido! Compre imediatamente um relógio de
pulso antimagnético.)

Torna-se difícil caminhar nas preciosas ruas.
Toda a gente se acotovela, se multiplica em gestos,
esfuziante.
Todos participam nas alegrias dos outros como se fossem
suas
e fazem adeuses enluvados aos bons amigos que passam
mais distante.
Nas lojas, na luxúria das montras e dos escaparates,
com subtis requintes de bom gosto e de engenhosa dinâmica,
cintilam, sob o intenso fluxo de milhares de quilovates,
as belas coisas inúteis de plástico, de metal, de vidro e de
cerâmica.

Os olhos acorrem, num alvoroço liquefeito,
ao chamamento voluptuoso dos brilhos e das cores.
É como se tudo aquilo nos dissesse directamente respeito,
como se o Céu olhasse para nós e nos cobrisse de bênçãos
e favores.
A oratória de Bach embruxa a atmosfera do arruamento.
Advinha-se uma roupagem diáfana a desembrulhar-se no ar.
E a gente, mesmo sem querer, entra no estabelecimento
e compra - louvado seja o Senhor! - o que nunca tinha
pensado comprar.

Mas a maior felicidade é a da gente pequena.
Naquela véspera santa
a sua comoção é tanta, tanta, tanta,
que nem dorme serena.
Cada menino
abre um olhinho
na noite incerta
para ver se a aurora
já está desperta.
De manhãzinha
salta da cama,
corre à cozinha
mesmo em pijama,
Ah! ! ! ! ! ! ! ! ! !
Na branda macieza
 da matutina luz
aguarda-o a surpresa
do Menino Jesus.

Jesus,
o doce Jesus,
o mesmo que nasceu na manjedoura,
veio pôr no sapatinho
do Pedrinho
uma metralhadora.
Que alegria
reinou naquela casa em todo o santo dia!
O Pedrinho, estrategicamente escondido atrás das portas
fuzilava tudo com desvastadoras rajadas
e obrigava as criadas
a caírem no chão como se fossem mortas:
tá. tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá.
Já está!
E fazia-as erguer para de novo matá-las.
E até mesmo a mamã e o sisudo papá
fingiam
que caiam
crivados de Balas.

Dia de Confraternização Universal,
dia de Amor, de Paz, de Felicidade,
de Sonhos e Venturas.
É dia de Natal.
Paz na Terra aos Homens de Boa Vontade.
Glória a Deus nas Alturas.

António Gedeão, Máquina de Fogo (1961)