quinta-feira, 15 de junho de 2017

O ELEITOR QUE CONFUNDIU UMA CANDIDATURA COM UMA BICICLETA



O eleitor consciente do seu dever cívico e que sabia já haver candidaturas às próximas eleições, decidiu começar uma empenhada busca de esclarecimentos para uma decisão ponderada e consciente. Para além dos fáceis gosto e das partilhas do facebook não queria deixar, em matéria como esta, de tomar decisão informada e de ir votar.

Foi assim que encontrou referências a uma já ativa candidatura, apoiada por quatro partidos e forças políticas, cujas siglas apareciam nos cartazes esmagadas pelo candidato comum, que vinha declarando distancia dos partidos e intenção de constituir uma equipa com independentes.

Claro que o eleitor estava curioso e confuso. Mas a política tem destas coisas, tão depressa se agregam partidos e se apela à fraternidade universal com  se excluem os pobres que aceitam o grande arquiteto da coligação.

Outra coisa que intrigou o eleitor foi ver, no meio de tanto ativismo, discursos repetidos sem pingo de novidade. Para a apregoada salvação da cidade não se percebia quais os principais desígnios nem as grandes medidas políticas. O que contava era a crítica e a acusação sem critério. É verdade que até às eleições haverá tempo para um programa claro, bem desenhado e fundamentado, ainda que não seja fácil com tantos partidos apoiantes e tantos ambicionados independentes.

Para já havia por ali muita oscilação, muita tremura e confusão de ideias. Mas todas as coisas têm o seu tempo, como vem na Bíblia.

Estava o eleitor neste emaranhado de dúvidas e interrogações quando olhou com atenção e percebeu que tinha, por lapso, misturado na sua leitura informações sobre a candidatura e um artigo sobre bicicletas. Da confusa candidatura tinha saltado para o desenho e características do selim, o tipo de mudanças (com um nome japonês), o tamanho das rodas, o sistema de travagem, o modelo mais adequado ao uso na cidade ou os modelos indicados para todo o terreno. Tudo coisas sobre bicicletas.

Como sabem os leitores estes acasos levam muitas vezes às grandes descobertas, às grandes ideias ou às mais intrigantes dúvidas sobre a origem do universo ou a natureza dos candidatos.

Instintivamente percebeu que havia ali qualquer coisa de premonitório.

Depois de se revolver em interrogações lembrou-se que uma coisa essencial numa bicicleta é o equilíbrio. O equilíbrio dos seus componentes e a capacidade de equilíbrio do seu utilizador. Uma solução anárquica, com carretos desajustados, rodas desconformes e sem adequado sistema de travagem é um problema. Ainda, por cima, se o condutor pedala aos zig-zag sem saber para onde verdadeiramente quer ir, dá mau resultado.

E foi assim que o consciencioso eleitor, que pretendia aproveitar as férias para se ir informando e adquirindo uma ideia segura sobre o futuro sentido do seu voto acabou ali, naquele momento, por chegar a uma inesperada conclusão: tinha confundido uma candidatura com uma bicicleta.

Talvez não tenha sido um mero acaso mas uma relevante coincidência. Agora ia esperar para ver quantos tombos o impulsivo ciclista não iria dar até outubro.

(Artigo publicado na edição de 15 de junho, do Diário de Coimbra)




quinta-feira, 1 de junho de 2017

É FÁCIL, É BARATO E DÁ...



Dentro de dias vai iniciar-se uma das maiores, senão a maior, campanha de marketing de um país, a nível mundial: a Volta a França em Bicicleta - “Le Tour”. 

É um espetáculo desportivo e televisivo em que verdadeiramente não se sabe se o mais relevante é o ciclismo se a venda da imagem da França. O ciclismo é o argumento mas desde há muito é o turismo e um conjunto de atividades económicas a ele ligadas, que é promovido de uma forma particularmente inteligente.

O “Giro” e a “Vuelta” são soluções decalcadas da prova francesa, assim como a nossa Volta a Portugal, só que as características do país, a sua dimensão, paisagem, riqueza histórica e cultural, bem como o património edificado, dão-lhe uma dimensão inigualável. Depois e não menos relevante, há uma consciência nacional da importância da imagem do país que suscita uma enorme participação popular.

Aprecie-se, por isso, o esforço e o mérito dos ciclistas mas olhe-se para as imagens dos espaços envolventes da prova, para o arranjo dos espaços públicos, dos edifícios históricos e mesmo das casas com jardins e flores que transmitem a imagem de um país cuidado e de grande beleza e organização.

Sabemos, todos, que na realidade a periferia das grandes cidades é, em muitos casos, assustadora e que as imagens que nos são apresentadas escondem realidades sociais bem duras, mas a imagem global com que se fica é altamente positivas.

Há, mesmo, um aspeto particular, que no nosso país é vulgar e muito associado ao poder local que são as rotundas. As rotundas, que são uma boa e económica solução a nível de segurança e de qualidade de circulação, são muitas vezes criticadas e com razão, por uma implantação excessiva e/ou deficiente conceção técnica.

Ora, como nos é abundantemente mostrado por essa França fora, as rotundas são não só equipamentos de natureza funcional mas também elementos estéticos, de embelezamento das entradas das cidades e tradutores de identidades regionais e locais.

É evidente que também temos bons exemplos, mas a verdade é que há ainda muito a fazer e que as nossas cidades vilas e aldeias terão muito a ganhar com a requalificação desses locais de encontro e de circulação por onde passa um enorme volume de trânsito e que são vistas por imensos cidadãos.

As rotundas são hoje um cartão-de-visita das cidades e também um elemento distintivo do interesse dos seus autarcas pela estética dos seus espaços, pela sua valorização ambiental e turística e pela criação de empatia com os visitantes e, se virmos bem, o seu alindamento é fácil, é barato e dá… 

(Artigo publicado na edição de 1 de junho, do Diário de Coimbra)