quinta-feira, 19 de setembro de 2019

O CARBONO E A VACA


A gravidade dos problemas climáticos que se têm vindo a sentir e que estão cientificamente identificados, levou o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, a convocar uma Cimeira para a Acção Climática, para o próximo dia 23 de setembro, alertando que ignorar as as alterações climáticas é ”suicida” , que “este é o desafio sobre o qual os líderes desta geração vão ser julgados” e que “esta é a batalha das nossas vidas”.

Conhecendo os principais actuais líderes políticos e tendo em conta que a prioridade dos lideres empresariais é, pura e simplesmente, o lucro é de temer que as palavras de António Guterres apenas tenham eco nalgumas franjas da sociedade civil e nalguns académicos, e que, consequentemente os resultados práticos não sejam o necessário nem o suficiente.

O modo de vida, que durante as últimas décadas construímos, está profundamente estruturado e demasiado arraigado para que rapidamente sejam possíveis as alterações profundas necessárias à alteração do paradigma civilizacional pelo qual se lutou. É verdade que vamos tendo algumas manifestações de preocupação perante a “emergência climática” que se vive e que se tem vindo a agravar de modo exponencial, mas as medidas concretas na maior parte dos caso são simbólicas.

Está neste caso a decisão tomada pelo reitor da Universidade de Coimbra (UC) de não haver carne de vaca nas ementas das cantinas universitárias, a partir de janeiro do próximo ano, face à poluição que a criação bovina representa. Independentemente do real mérito da decisão a verdade é que ela assumiu uma significativa dimensão mediática e aí temos instalada a “Questão da vaca”.
É natural que a universidade coloque questões relevantes, que faça uso do seu know-how cientifico para justificar as suas posições e, sobretudo, que actue e corrija naquilo que é responsabilidade própria, dando o exemplo e contribuindo para uma mudança e formação comportamental dos alunos, que são as elites de amanhã.

O reitor também anunciou outras medidas de natureza ambiental de ataque ao CO2, menos controversas mas importantes, havendo uma, que apenas ouvi sussurrar, relativa à circulação automóvel no Polo I que merece atenção urgente, porque ela não tem só a ver com poluição ambiental, mas também com poluição visual e é uma afronta ao património histórico da UC – o estacionamento automóvel no parque da Porta Férrea!

É uma verdadeira afronta à UC aquele estacionamento, que servirá a reitoria e professores, que deveria ser encerrado de imediato constituindo-se numa decisão exemplar, não controversa, dignificadora da imagem da UC e demonstrativa da vontade e da força da actual equipa reitoral.

Aliás, se há elemento poluidor em Coimbra – uma cidade de serviços – são os automóveis. Eles são os principais emissores de CO2 da cidade e por isso, para que a UC, que está situada no coração da cidade, seja a primeira universidade portuguesa neutra em carbono, os Polos universitários deveriam ser considerados, com urgência, “Territórios Livres de Automóveis Privados”, neles apenas podendo entrar e circular transportes públicos e velocípedes.



quinta-feira, 5 de setembro de 2019

IMPORTANTE NÃO É O QUE SE DIZ, MAS QUEM O DIZ


É sabido que mais importante do que o que se diz é quem o diz.

Por exemplo: se eu disser que estou a planear uma intervenção nos jardins, rotundas, separadores centrais de ruas e avenidas, e espaços públicos de Coimbra, plantando flores ou instalando canteiros, de modo a que a cidade vença o ar vazio e pouco cuidado que a diminui e aumente a auto-estima dos seus habitantes e a empatia dos visitantes, ninguém levará a sério esta afirmação ainda que com ela possa concordar.

Com efeito tendo o único poder de sonhar não posso fazer nada de concreto e, como tal, posso dizer coisas interessantes que se limitam a morrer frente aos olhos de quem me lê.

Outra coisa seria o presidente da Câmara dizer exatamente o mesmo. Aí haveria de imediato quem se congratulasse e que aguardasse expectante que no outono que aí vem, bom momento para início dos trabalhos, se começasse a ver a terra remexida para as plantações e a colocação dos primeiros canteiros a expulsarem carros de algumas das nossas simpáticas pracinhas que são importantes espaços de respiração no tecido urbano.

Como se percebe a mesma afirmação suscita duas atitudes diferentes porque quem as faz tem responsabilidades, capacidades e estatutos totalmente diferentes.

Outro exemplo. Em 13 de dezembro de 2018 publiquei, neste mesmo espaço, um artigo “Obrigado à comunicação social”, em que defendi a importância de uma comunicação social livre e forte como condição essencial à nossa democracia e à nossa respiração cívica, e em sugeria que as Câmaras Municipais atribuíssem uma assinatura anual dos jornais locais aos jovens residentes nos seus Municípios, com base numa solução a acordar com esses órgãos de comunicação social.

Claro que a minha sugestão, que não teve qualquer recetividade, permitiria não só ajudar de forma imparcial e isenta uma comunicação social que notoriamente enfrenta dificuldades, mas também ganhar e fidelizar leitores.

Pois bem, não é que por estes dias, o presidente da República veio defender incentivos do Estado aos media, face às dificuldades que estes atravessam, sugerindo, por exemplo, incentivos à leitura de jornais por jovens nas escolas, através do financiamento de assinaturas.

Ora se a minha proposta não terá merecido mais do que um condescendente sorriso momentâneo, a sugestão do presidente da República tem um peso relevante e os responsáveis políticos, concretamente os autárquicos, deviam considerá-la. É que sem prejuízo de medidas de âmbito governamental há uma necessidade, que para Coimbra é uma emergência, de conseguir criar uma visão, uma estratégia e uma vontade regional que precisa da voz da comunicação.

Para que se possa falar de um aeroporto para servir a região centro ou de um sistema de mobilidade trans-municipal é preciso criar sinergias de identidade e de proximidade que só serão possíveis com uma comunicação social regional forte e livre.

Por isso, talvez fosse bom dar atenção não às minhas mas às sugestões do presidente da República, porque verdadeiramente importante não é o que se diz mas quem o diz.