quinta-feira, 25 de julho de 2019

CULTURA CAPITAL


A Câmara quer candidatar Coimbra a Capital Europeia da Cultura em 2027, mas não sei se Coimbra quer ter essa responsabilidade.

Nas últimas décadas foi afirmado que Coimbra queria isto aquilo, quase sempre relevantes projetos, que envolveram diversificados grupos de trabalho, reputados técnicos, aprofundados estudos e muito dinheiro gasto, com resultados dececionantes ou nulos.

Coimbra quis ser Cidade da Saúde, investiu numa feira temática, em trabalho técnico com apoio comunitário e foi tudo por água abaixo. Quis participar no EURO 2004, e acabou por ter acrescidos encargos porque os opositores da participação - por causa dos custos -, uma vez no poder, gastaram mais de um milhão de contos (moeda da altura) num outro estádio (?) de futebol de que ainda hoje não se sabe se está em situação legal. Quis ter o seu Programa Polis e porque houve mudança de poder autárquico viu o projeto truncado e acabado a meio.

Coimbra quis ter um metro ligeiro de superfície, como tantas outras cidades europeias de idêntica dimensão, para substituir uma velha e ultrapassada solução ferroviária pesada que, para mais, lhe barrava o acesso ao rio e acabou, muito graças ao contributo duma intensa guerrilha interna, que o poder central agradeceu, por chegar até aos dias de hoje sem solução pesada nem ligeira.

Coimbra foi Capital Nacional da Cultura e o resultado foi frustrante acabando por contribuir para a falência desse projeto nacional.

E, tudo isto, porquê? Razões muitas não faltarão. Mas a inexistência de uma visão global para a cidade, assumida pelos diversos poderes aqui existentes; o medo do futuro, fruto de um saudosismo doentio; a falta de lideranças políticas e sociais qualificadas e mobilizadoras; a infantilização das disputas partidárias; a dificuldade em olhar e cativar a região em redor; e, muito em particular, a incapacidade de mobilização transversal dos cidadãos de uma cidade média que é culturalmente e socialmente diversa.

Claro que um projeto desta natureza, que implica uma visão de médio prazo, suscita múltiplas interrogações e uma basilar, particularmente para o Grupo de Trabalho, será a de perceber que Cidade será ou pode ser Coimbra em 2027. Haverá uma “nova” cidade, um novo paradigma urbano nesta cidade universitária, determinado pelo contexto externo e/ou por vontade e mérito endógeno?

O Grupo de Trabalho da Candidatura de Coimbra a Capital Europeia da Cultura 2027 vai trabalhando e do seu trabalho vai decerto resultar uma proposta competente, devendo no entanto ter em conta que se a candidatura não tiver vencimento lhe serão imputados todos os males e cobrados todos os cêntimos; e que se for vencedora dificilmente verá muitas das suas propostas concretizadas porque entretanto haverá dois atos eleitorais autárquicos e logo irredutíveis vontades de mudar tudo.

A manter-se o atual ambiente urbano de acédia coletiva e porque a cultura não é aqui hoje capital, será que Coimbra quer mesmo ser Capital Europeia da Cultura em 2027?

quinta-feira, 11 de julho de 2019

ANO DE AMEIXAS


Ano de ameixas é ano de queixas. Uma rima fácil para uma verdade empírica em risco de colapso. Este ano há um excesso de ameixas o que quer dizer que não vão faltar queixas. Contudo, mesmo que não houvesse uma única ameixa ao cimo da terra nunca faltariam queixas porque é um ano eleitoral.

As queixas fazem parte do nosso quotidiano. Queixa-mo-nos de tudo e mais alguma coisa. Até nos queixamos das queixas. Por isso façamos bom uso das ameixas e deixemos de lhes imputar a responsabilidade pela dimensão e intensidade das queixas. Melhor será tentar uma rima ou um trocadilho que envolva as queixas e as redes sociais porque é aí que agora está o busílis.

Queixa-mo-nos do que temos e do que não temos, com a ressalva de que nos queixamos muito pouco de nós próprios. Eu queixo-me de não me queixar mais. É uma falha que reconheço e que resulta do facto de gostar – cada vez mais - do meu país e da minha cidade. Não sou responsável por ter nascido aqui, mas sou responsável por viver em Coimbra e isso inibe-me de alguns queixumes.

Há quem escolha viver num determinado sítio pela negativa, isto é, escolhe viver ali porque não existem coisas de que não gosta. A contrario eu escolhi viver aqui porque aqui existem coisas de que gosto. O que me perturba é ver que há algumas dessas coisas que vão desaparecendo, ou sendo postas em crise e outras, ainda, que não são suficientemente exponenciadas.

Estamos a viver um momento de profundas transformações sociais, económicas e políticas, a uma velocidade estonteante, e não estamos, por aqui, a ser capazes de apanhar o ritmo nem de perceber a melodia. Definitivamente encalhámos. Conseguimos, nestes últimos anos, resolver muitos problemas infraestruturais e agora que temos a possibilidade de dar o passo seguinte dá ideia que não há ideias. Falta rasgo, imaginação, criatividade e, também, um olhar de águia sobre o nosso quotidiano, que nos obrigue a corrigir as pequenas/grandes maleitas que nos desgostam.

Pior. Entrámos, à semelhança do que acontece por esses país fora, em modo festivaleiro, consumindo recursos relevantes, sem mérito e sem retorno, que nos irão fazer falta para projetos estruturais e de futuro. Há uma espécie de esquizofrenia, caracterizada por um mar de queixas de baixos salários, desemprego jovem, taxas moderadoras na saúde, preço dos combustíveis, etc, etc, etc., e, por outro, por um mar de festivais financiados com dinheiros públicos pelas autarquias ou pagos, e bem pagos, por milhares de queixosos.

Hoje, está provado, que podem faltar ameixas mas o que não faltam são queixas.