quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

A ARTE DA PRUDÊNCIA - 13

Agir com intenção, com primeira e segunda intenções.

A vida do homem é milícia contra a malícia do homem: a sagacidade luta com estratagemas mal intencionados. Nunca faz aquilo que dá a entender: aponta, sim, para despistar; insinua-se com habilidade e dissimulação; e age na inesperada realidade, sempre pronta a confundir. Deixa cair uma intenção para tranquilizar a atenção alheia, e volta-se imediatamente contra ela, vencendo pelo imprevisto. Mas, à inteligência penetrante, previne-a com observações cuidadosas, espreita-a com cautelas, entende sempre o contrário do que quer que entenda, e descobre instantaneamente qualquer jogo duplo; deixa passar qualquer primeira intenção, sempre à espera da segunda e ainda da terceira. A simulação aumenta quando se descobre a artimanha, e nessa altura tenta enganar com a própria verdade; muda de jogo, para mudar de estratagema, e converte em engano a verdade sincera, baseando a sua astúcia numa enorme candura. Surge então a advertência e, ao entender a intenção do outro, expõe as trevas revestidas de luz; decifra a intenção, mais dissimulada quanto mais simples. Assim luta a astúcia de Pitón contra a candura dos penetrantes raios de Apolo.

A Arte da Prudência
Baltasar Gracián

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