quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

DA DESCARACTERIZAÇÃO DE COIMBRA

O dia 15 de Dezembro trouxe-nos mais dois elementos que, ainda que não tendo uma relação directa entre si, são contributos evidentes para o desenvolvimento do processo de descaracterização e também de decadência de Coimbra.

O primeiro é, obviamente, o da colocação de câmaras de videovigilância na Baixa da Cidade. Coimbra entrou assim no rol das cidades inseguras. Sendo a colocação das câmaras não mais do que uma manobra tendente a esconder a incapacidade de desenvolver um processo de urbanismo comercial na Baixa ele é, sem dúvida, sintomática de uma forma de estar e fazer política urbana que não tem nada a ver com a natureza e tradição da cidade.

Mais do que isso. É o começo de um processo que tenderá a desenvolver-se e a “roubar-nos” a liberdade de utilização e fruição do espaço público de uma forma que era peculiar e que singularizavam Coimbra no contexto urbano/universitário nacional. Penso que muitos daqueles que apoiam esta medida não têm a verdadeira noção do seu significado e das suas consequências futuras e que no dia em que perceberem o grave erro que cometeram, ou ajudaram a cometer, será tarde.

Para mais esta é uma política do “bloco central” que não sofreu contestação política de ninguém, nem daquelas forças políticas que se afirmam de “verdadeira” esquerda, o que me parece ainda mais estranho e grave. Decerto serei eu que estou errado mas lamento profundamente que a minha cidade seja incluída num roteiro de insegurança com a agravante de que os mecanismos adoptados não vão resolver nenhum dos reais problemas que a sua área comercial tradicional enfrenta.

No futuro será a gestão do Dr. Carlos Encarnação que ficará com o ónus desta medida, e espero que isso não seja esquecido, mas será também o apoio de autarcas do PS e da CDU que ficará registado, bem como a decisão dum Governo PS que vem politicamente preconizando intervenções deste género, bem diferentes daquelas em que investiu alguns anos atrás e que tão bons resultados trouxeram. Refiro-me, por exemplo ao Programa Pólis e a programas específicos de urbanismo comercial.

Hoje estamos na fase do bigbrother e do voyarismo policial como pseudo mecanismo de segurança quando seria fundamental apostar em políticas de renovação urbana e de humanização funcional dos espaços públicos.

O segundo elemento gravoso para Coimbra, não só no campo simbólico mas também prático e que terá óbvios reflexos negativos a prazo, tem a ver com a criação dum novo curso de medicina na Universidade de Aveiro. Não é tanto a questão do novo curso que nos deve preocupar é a sua estruturação e o que ela representa de desenvolvimento de uma rede articulada que envolve o norte do País e que significa que é aí que se vai desenvolver o cluster da saúde.

Esta é já hoje uma realidade que se deve ao abandono por mesquinhez política do Projecto Coimbra Cidade da Saúde, imediatamente posto em causa com a chegada à Câmara do Dr. Carlos Encarnação, só porque tinha sido iniciado pelo anterior Executivo. Havia trabalho político e técnico feito que a ser continuado teria permitido um salto qualitativo nesta área na nossa cidade mas a falta de visão e a mesquinhez política, que nunca é de mais sublinhar, levaram à morte desse projecto. 

A investigação e a aplicação prática dos seus resultados na área das ciências da vida está agora definitivamente considerada como uma vocação do Norte. Dum Norte com o epicentro no Porto e que se estende de Aveiro até Viseu comprometendo qualquer veleidade de Coimbra assumir no futuro um papel relevante nesta área tanto mais que lhe vai escassear massa crítica suficiente para esse trabalho.

Coimbra, não quis combater o bom combate de afirmação no campo da saúde, outros o fizeram com sucesso. Coimbra vai tendo o que merece. Até mereceu ter como cabeça de lista uma ministra da saúde que, como se vê, tem sido extremamente importante na salvaguarda dos seus interesses mais profundos e determinantes para o futuro.

O dia 15 de Dezembro de 2009 ficará assim inscrito, porque o quisemos e porque não tivemos força interna para o combater, como mais um dia a assinalar no processo de descaracterização e decadência de Coimbra.

Nota: Artigo publicado no Diário de Coimbra, em 17 de Dezembro de 2009

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