segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

CIDADE SEM LIVRO DE RECLAMAÇÕES

O Público trazia ontem, Domingo, no seu suplemento P2, um interessante trabalho, assinado por três jornalistas entre as quais Graça Barbosa Ribeiro, sobre a participação e o envolvimento dos cidadãos na resolução dos problemas das suas cidades.

É, sem dúvida, uma temática interessante e é curioso que o artigo com o título Participação tenha como sub-título a frase apelo do Provedor do Ambiente e Qualidade de Vida Urbana de Coimbra, professor Massano Cardoso: "Incomodem! Por que é que não incomodam mais?" 

O que tem vindo a acontecer nestes últimos anos em Coimbra, no que toca à intervenção e participação cívica dos cidadãos na vida da cidade, tem registado um incompreensível refluxo.

Depois da emergência de um interessante movimento cívico, que teve a sua expressão mais visível na criação da Pró-urbe e no Conselho da Cidade - fruto em larga medida do combate à co-incineração -, que envolveu políticos e figuras académicas de prestígio veio-se a assistir a gradual apagamento dessa vontade cívica de participação.

Não tenho dúvidas que uma das causas foi a do aproveitamento feito, por algumas forças partidárias, dessas plataformas participativas para o combate político-partidário, concretamente contra a gestão autárquica do Dr. Manuel Machado. Houve uma óbvia instrumentalização de generosas vontades e empenhadas atitudes cívicas daqueles que assumiam o desejo de ver na sua cidade uma democracia de grau superior e mais participativa, de que era exemplo a elaboração de um Orçamento Participativo à semelhança, aliás, de experiências conhecidas noutros países.

Claro que o tacticismo e o oportunismo de certas forças partidárias e de certos protagonistas políticos deitou tudo a perder dado que logo que conquistado o poder houve uma silenciamento estratégico das iniciaitvas antes preconizadas e mesmo um retrocesso a nível de transparência da gestão autárquica.

As decisões da Câmara, nomeadamente as de natureza urbanísticas, deixaram de ser publicitadas na comunicação social, como aconteceu durante 12 anos; as reuniões da Câmara entraram num processo de "anarquia funcional" com o agendamento frequente de processos à margem do estabelecido no respectivo Regimento; as reuniões passaram de semanais para quinzenais e, mais recentemente, deixaram de contar com a presença dos jornalistas, contrariamente ao que aconteceu durante os 30 anos anteriores. 

Isto é, houve um fechamento da actividade autárquica, em tudo contrário ao movimento geral de maior abertura e transparência no caminho de uma governança municipal e aqui o meu profundo espanto tudo isto aconteceu gradual e serenamente sem uma reacção colectiva ou individual, mormente daqueles que anos antes preconizaram e trabalharam em prol de uma nova e mais qualificada gestão autárquica.


A cidade perdeu e continua a perder capacidade de reflexão e os cidadãos vão perdendo, obviamente, capacidade e vontade de participação cívica. Reclamar a quem e para quê? As portas vão-se fechando, a ignorância das decisões crescendo e os incómodos aumentando.


Há, aliás, uma sensação óbvia de medo em Coimbra, aquilo que a presidente do PSD tantas vezes referiu: uma crescente asfixia democrática. Neste caso, sem retórica política, com elementos e momentos perfeitamente identificáveis.


Diz o artigo do Público que: "As cidades deviam vir com livro de reclamações". Eu, sem deixar de concordar, digo que as cidades e neste caso Coimbra devia ter cidadãos mais corajosos e coerentes, que fossem capazes de continuar os bons combates, e que não se curvassem medrosamente perante certos autarcas ou forças políticas.


As nossas cidades vão tendo o que merecem e Coimbra é um exemplo concreto de uma cidade em perda por falta de intervenção cívica, espantosamente de muitos que tendo conhecimentos e estatuto debandaram dos combates locais e se refugiam nas teorizações nacionais, omitindo que no seu "condomínio" urbano se passa tudo aquilo que condenam no âmbito nacional.    

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