É difícil acreditar que a actual campanha eleitoral suscite qualquer reflexão sobre o nosso futuro colectivo e que permita uma racional escolha partidária.
O ruído, o vazio, os ódios e as
acusações sobrepõem-se aos argumentos e a qualquer visão prospectiva. Aliás, um
olhar sereno e tão descomprometido quanto possível, leva-nos a algumas
espantosas ilações, que mais do que esclarecer fomentam dúvidas e
interrogações.
Uma das questões marcantes é a do
surgimento de uma nova perspectiva, já identificada noutros países, de
antagonismo entre os defensores da justiça social e os apologistas do
progresso. Quem defende a justiça social fá-lo hoje barricado na defesa das
conquistas do passado e na rejeição de uma visão progressista e inovadora da
sociedade, porque só adivinha derrotas e retrocessos.
Também, espantosamente, os
conservadores de ontem aparecem hoje como os grandes partidários da
modernização, numa interpretação de que este é o seu tempo e que o futuro é
construindo obrigatoriamente por si, dado que a esquerda está esgotada e sem
margem de manobra política.
Como alguns observadores vêm
fazendo notar, parece que é verdadeira a ideia de que a defesa de uma visão de progresso
passou gradualmente da esquerda para a direita, que fala em avançar, acelerar,
adaptar-se, reformar, etc.
Aliás a esquerda não apresenta
qualquer projecto de sociedade estruturado e exequível, sendo, ou uma esquerda
radical que está fora do tempo e do espaço, ou uma esquerda que não tem mais do
que um discurso antidireita. A esquerda parece o território do puro pessimismo
que reflecte a incapacidade de parar a tal direita que assume descarada a
vitória antes do tempo porque o programa vencedor, conhecido e validado antes
das eleições, é o seu.
A esquerda de poder, no fundo,
bate-se pela ideia de resistência e de moderação de um programa de direita à
luz de um pragmatismo militante onde não há espaço para a utopia que decorria,
no passado recente, da sua confiança no futuro e no progresso e sustentava uma
visão optimista e reconfortante do nosso desenvolvimento.
A direita, por seu lado, onde não
se percebem distinções programáticas, até passou a ser optimista e a aparecer
com a convicção de que só ela é futuro, só ela é esperança, segurança e progresso.
Mais ainda, parece que a esquerda
se apresenta sem visão e sem paixão, encurralada entre novas formas de
participação cívica que lhe roubam protagonismo e protagonistas, e sem
capacidade de garantir uma correcta governança perante a pressão de uma direita
que usa a redutora visão do contribuinte em detrimento do cidadão.
Depois, globalmente, os políticos
assumiram, num estranho haraquiri, o discurso de que na política não só vale
tudo como é óbvia a sua subordinação a projectos de realização pessoal, destruindo
a confiança e o necessário élan
colectivo.
É pena a incapacidade da
construção de um projecto de esquerda com as esquerdas. Os puros terão,
porventura, o reino dos céus mas nunca vencerão neste reino terreno, e os
outros, os pecadores, não são capazes de confessar os seus pecados, pelo que
vamos tendo o que não merecemos mas o que construímos com anos de rancor e
disputas herdadas de um século que já passou há tanto tempo.
E agora o que fazer? Deixar a
direita ganhar para que a esquerda se possa reconstruir ou apostar na esquerda
a fazer de direita para tentar minorar as maldades subscritas?
Temos uma semana para decidir. Por
isso, ajudem-nos a resolver este dilema e digam-nos alguma coisa de
verdadeiramente substancial e interessante sobre o futuro…
Sem comentários:
Enviar um comentário