quinta-feira, 31 de maio de 2018

GRATIDÃO E LEALDADE


Tenho um divida de gratidão para com Coimbra que nunca conseguirei pagar.

Na conta corrente do meu viver há um imenso débito que tenho para com ela, que vou procurando amortizar defendendo-a e tentando que lhe deem o carinho, a atenção e o cuidado de que entendo ser merecedora.

Escrevo, por isso e também por lealdade, frequentemente sobre Coimbra, sabendo que corro o risco de múltiplos entendimentos, nomeadamente os de que as minhas palavras criticas têm um destinatário preciso. Não é verdade, o que escrevo é a favor de Coimbra!

Para mais, Coimbra tem a particularidade de ser uma cidade onde coexistem diversos poderes, muitas “igrejas” e “capelas” e por isso admito que os meus escritos sejam lidos pelos crentes desses “templos” de forma variada.

A questão essencial é que a minha cidade não tem conseguido ultrapassar certos estrangulamentos e confusões e tem, por isso mesmo, ficado para trás num campeonato exigente e complexo que não permite hesitações, tibiezas e, sobretudo, inercias, o que não se pode deixar de lamentar.

Sabemos que o demasiado novo (neofilia) desconcerta e que o demasiado velho (neofobia) aborrece, mas há que saber aproveitar os contributos dos defensores dessas teses, tendo em conta que o importante é que olhemos para onde devemos e não para onde querem que olhemos.

É, igualmente, sabido que as doenças que atingem muitas cidades têm a ver com mudanças subterrâneas, quase impercetíveis, e que outras emergiram de situações difíceis e se tornaram espaços vibrantes porque houve a capacidade de escutar e ouvir, e de perceber novas realidades.

Uma outra divida de gratidão que tenho é para com o 25 de Abril. Não consigo imaginar o que seria a minha vida sem esse dia extraordinário. Se relativamente a Coimbra tenho de enaltecer os méritos do espaço onde vivo, relativamente ao 25 de Abril tenho de agradecer a liberdade e os valores que me permitiram ter futuro como cidadão. Por isso também aqui a minha gratidão e a minha lealdade.

Acontece que nas recentes comemorações do 25 de Abril, em Coimbra, um dos momentos mais destacados foi o da inauguração de um parque de estacionamento na Praça das Cortes, junto a uma entrada da cidade. Confesso a minha dificuldade em conciliar estas duas coisas. Para mim a cidade necessita de intervenções de requalificação do espaço público que tenham em conta as pessoas e um olhar para o futuro.

Colocar o carro como objeto de preocupação principal e elevá-lo a ícone, ainda que momentâneo, de uma revolução libertadora não me parece que tenha sido um contributo positivo para este dia, para mais uma Praça que tem o nome de um relevante acontecimento histórico.

Contrariamente ao que muitos dos meus concidadãos defendem, não são os carros e a profusão de estacionamento que farão de Coimbra uma cidade de futuro, bem pelo contrário. Um dia os nossos filhos e netos condenarão a nossa cegueira automóvel e o que temos destruído, ou não realizado, em seu nome.

Esta não foi a celebração que Abril e Coimbra mereciam. Digo-o por gratidão e lealdade.

Sem comentários:

Enviar um comentário