quinta-feira, 4 de maio de 2017

A SENSIBILIDADE DAS ROSAS



Quem não se lembra dos tempos de indignação? Das manifestações e tomadas de posição públicas sobre as políticas e os políticos acusados de mentir e de desrespeitar os compromissos eleitorais? 

Parece qualquer coisa distante, mas não. Os tempos de indignação foram ontem! Hoje vive-se a pós-verdade. São os tempos de Trump, da vitória da mentira e da desfaçatez. Já não há indignação mas apoio declarado a mentirosos compulsivos e a políticos/não-políticos, que, mesmo desmascarados, continuam a ter o apoio entusiástico dos eleitores, sem que se consiga perceber o que afinal conta.

De um momento para o outro surgiu uma nova e estranha realidade, alheia a valores essenciais e que reflete uma sociedade estranha, descompensada e falsa, que faz pensar naquela frase de Alberto Manguel sobre a complexidade da realidade, no seu fascinante livro “ Uma história da curiosidade”, que nos diz: “A melhor maneira de contar a verdade é mentir”.

Cabendo aos partidos, nas sociedades democráticas, dar respostas aos problemas e aos anseios dos cidadãos o que se vê é que perante a sua incapacidade de perceber atempadamente esta nova realidade, entram em desagregação ao mesmo tempo que surgem movimentos e propostas políticas que ultrapassam aquilo que vinha sendo uma das regras do jogo, isto é: os partidos recolhiam os votos e os movimentos sociais procuravam modificar os temos dessa recolha. Parece que enfrentam um fenómeno idêntico àquele que é descrito como a fadiga dos materiais.

Talvez, um pouco como metáfora, mas sobretudo como procura de solução para a situação que se vive e cuja gravidade é difícil perceber em toda a sua extensão, pensar na técnica usada pelos vitivinicultores para se anteciparem à chegada das doenças às suas vinhas e atuarem com o adequado tratamento preventivo.

Sabendo que o míldio e o oídio, duas das principais doenças das vinhas, atacam antecipadamente as roseiras, porque estas são mais sensíveis, plantam roseiras a bordejar os vinhedos conseguindo, desta forma, um eficaz e belo método natural de informação. 

Ora os partidos também precisam de sensores que antecipem as doenças que se aprestam a atacá-los e o que se vê é que isso não tem vindo a acontecer, limitando-se a repetir estafadas práticas políticas e a adotar narrativas arcaicas.

Os partidos políticos em Coimbra, perante o cenário das próximas autárquicas, precisam urgentemente de plantar roseiras sensoriais para prevenirem graves moléstias.

(Artigo publicado na edição de 4 de maio, do Diário de Coimbra)

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