Sendo
a corrupção um cancro social de imensa gravidade e nefastas consequências a
análise do primeiro relatório da Comissão Europeia sobre anticorrupção na
Europa deveria merecer uma particular atenção de todos nós, porque como muito bem
diz o Dr. Guilherme d’Oliveira Martins – Presidente do Conselho de Prevenção da
Corrupção: “A prevenção da corrupção faz-se por todos e todos os dias.”, e essa
prevenção implica uma consciência coletiva do problema, em todas as suas
dimensões.
Aliás,
não deixa de ser curioso que na sondagem do Eurobarómetro 94% dos portugueses
inquiridos tenha referido que não foi vítima ou presenciou casos de corrupção, ao
mesmo tempo que 90% dos mesmos inquiridos referem que a corrupção é um problema
totalmente generalizado no país. Ora estamos aqui perante uma situação
contraditória que tem a ver com a nossa cultura e a perceção que temos do
fenómeno.
Seria,
por isso, interessante conhecer a resposta à pergunta sobre se alguma vez
corrompeu ou tentou corromper alguém, assim como também seria interessante
conhecer a percentagem daqueles que denunciaram casos de corrupção e a sua natureza.
É
que, quer se queira quer não, há questões de formação e de natureza cívica que
perturbam a análise e que não nos permitem uma visão clara do problema. Não
será, por exemplo, que muitos dos que se queixam da corrupção e do compadrio são
aqueles que frequentemente procuram o favor? Não será que muitos dos que se
queixam destes males elogiam permanentemente as atitudes de esperteza dos que
conseguem violar a regra ou ultrapassar os outros? Onde está a sanção social
aos transgressores? Onde acaba a inveja e começa a verdadeira consciência dos
atos de corrupção?
Quando
90% dos cidadãos considera qua a corrupção está generalizada no país isso não
pode deixar de significar que algum ou alguns dos seus familiares ou amigos
estão envolvidos nesse atos. Mas se perguntar quem são eles a resposta será a
de sempre: os meus familiares e amigos são incapazes de atitudes dessas, os
corruptos são os outros.
Uma
das questões que, também, merecia reflexão e análise é a da instrumentalização
da perceção da corrupção. É que uma forma fácil dos verdadeiros corruptos e
corruptores escaparem é a de generalização do problema e da criação de classes
de bodes expiatórios.
Por
isso o combate á corrupção devia implicar uma atuação cirúrgica e implacável da
justiça, em tempo útil e a vários níveis. Esta é uma área em que o exemplo
deveria assumir uma dimensão relevante
porque estamos no campo dos comportamentos e perante um fenómeno de todos os
tempos.
Mas,
por falar em prevenir a corrupção, recordo o caso exemplar que vivi como
deputado municipal. Perante a nomeação pelo presidente da Câmara da altura do
presidente de um clube de futebol como diretor municipal do urbanismo senti-me
praticamente isolado - política e socialmente - na contestação a essa decisão.
Tendo colocado a questão numa perspetiva preventiva e de defesa de princípios
perante uma situação inequivocamente problemática, para mais quando tanto se
alertava para os perigos das relações entre autarquias, imobiliário e clubes de
futebol, assisti, num cidade como Coimbra, a um enorme encolher de ombros
coletivo. Aliás se houve alguém penalizado fui eu. Depois veio a acontecer um
conjunto de factos que comprovaram a minha razão mas era tarde e alguns dos
principais protagonistas continuaram como se nada fosse com eles. Aliás chutaram
com toda impudicícia o problema para o âmbito da consciência de terceiros e hoje
vivem felizes, decerto a teorizar sobre a necessidade de prevenir a corrupção.
Claro que a ausência de valores, que é a grande madre de tantas das nossas desgraças, levará a que no próximo ano, se houver novo relatório, a idênticas conclusões, a repetir a indignação e a apelar a medidas corretivas, mas até lá ficamos-nos por aqui.
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