terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

A ETERNA CORRUPÇÃO

Sendo a corrupção um cancro social de imensa gravidade e nefastas consequências a análise do primeiro relatório da Comissão Europeia sobre anticorrupção na Europa deveria merecer uma particular atenção de todos nós, porque como muito bem diz o Dr. Guilherme d’Oliveira Martins – Presidente do Conselho de Prevenção da Corrupção: “A prevenção da corrupção faz-se por todos e todos os dias.”, e essa prevenção implica uma consciência coletiva do problema, em todas as suas dimensões.

Aliás, não deixa de ser curioso que na sondagem do Eurobarómetro 94% dos portugueses inquiridos tenha referido que não foi vítima ou presenciou casos de corrupção, ao mesmo tempo que 90% dos mesmos inquiridos referem que a corrupção é um problema totalmente generalizado no país. Ora estamos aqui perante uma situação contraditória que tem a ver com a nossa cultura e a perceção que temos do fenómeno.

Seria, por isso, interessante conhecer a resposta à pergunta sobre se alguma vez corrompeu ou tentou corromper alguém, assim como também seria interessante conhecer a percentagem daqueles que denunciaram casos de corrupção e a sua natureza.

É que, quer se queira quer não, há questões de formação e de natureza cívica que perturbam a análise e que não nos permitem uma visão clara do problema. Não será, por exemplo, que muitos dos que se queixam da corrupção e do compadrio são aqueles que frequentemente procuram o favor? Não será que muitos dos que se queixam destes males elogiam permanentemente as atitudes de esperteza dos que conseguem violar a regra ou ultrapassar os outros? Onde está a sanção social aos transgressores? Onde acaba a inveja e começa a verdadeira consciência dos atos de corrupção?

Quando 90% dos cidadãos considera qua a corrupção está generalizada no país isso não pode deixar de significar que algum ou alguns dos seus familiares ou amigos estão envolvidos nesse atos. Mas se perguntar quem são eles a resposta será a de sempre: os meus familiares e amigos são incapazes de atitudes dessas, os corruptos são os outros.

Uma das questões que, também, merecia reflexão e análise é a da instrumentalização da perceção da corrupção. É que uma forma fácil dos verdadeiros corruptos e corruptores escaparem é a de generalização do problema e da criação de classes de bodes expiatórios.

Por isso o combate á corrupção devia implicar uma atuação cirúrgica e implacável da justiça, em tempo útil e a vários níveis. Esta é uma área em que o exemplo deveria  assumir uma dimensão relevante porque estamos no campo dos comportamentos e perante um fenómeno de todos os tempos.

Mas, por falar em prevenir a corrupção, recordo o caso exemplar que vivi como deputado municipal. Perante a nomeação pelo presidente da Câmara da altura do presidente de um clube de futebol como diretor municipal do urbanismo senti-me praticamente isolado - política e socialmente - na contestação a essa decisão. Tendo colocado a questão numa perspetiva preventiva e de defesa de princípios perante uma situação inequivocamente problemática, para mais quando tanto se alertava para os perigos das relações entre autarquias, imobiliário e clubes de futebol, assisti, num cidade como Coimbra, a um enorme encolher de ombros coletivo. Aliás se houve alguém penalizado fui eu. Depois veio a acontecer um conjunto de factos que comprovaram a minha razão mas era tarde e alguns dos principais protagonistas continuaram como se nada fosse com eles. Aliás chutaram com toda impudicícia o problema para o âmbito da consciência de terceiros e hoje vivem felizes, decerto a teorizar sobre a necessidade de prevenir a corrupção.

Claro que a ausência de valores, que é a grande madre de tantas das nossas desgraças, levará a que no próximo ano, se houver novo relatório, a idênticas conclusões, a repetir a indignação e a apelar a medidas corretivas, mas até lá ficamos-nos por aqui.






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