1. Este será o ano que a memória coletiva recordará como o ano da morte de Nelson Mandela. Um ano aziago. Para os portugueses foi um ano de sofrida aprendizagem e dolorosas vivências. Parece que as sete pragas do Egito, em versão atualizada, caíram sobre nós.
Vimos agravar-se a miséria e o sofrimento, assistimos à
diminuição do emprego, dos direitos laborais e sociais e sentimos a quebra de
segurança na saúde e na velhice. O ano de 2013 tornou-se pior que o anterior,
que já fora pior do que o outro anterior, apesar das promessas vencedoras em
2011, que nos diziam que com a austeridade e a troika (coisa não vinda de leste
como a expressão, mas das américas e das alemanhas) iríamos vencer os dramas
causados por uma vampiresca crise financeira.
Pois sim. Tudo foi correndo cada vez pior e fomos percebendo
que estávamos perante o mel do empobrecimento, dos baixos salários, da
submissão a uma agenda internacional executada por uns rapazes da casa, que
tinha inscrita, ao mesmo tempo, a venda do nosso património estratégico e a
nossa transformação em mão de obra barata a favor do lucro financeiro. Até o
investimento em “massa cinzenta” que tínhamos vindo a fazer passou a ser
intensamente colhido por outros. Continuámos a aprender como a mentira pode ser
apresentada de tantas formas e feitios e que ajustamento é uma forma
eufemística de dizer: crise; recessão; falências; desemprego; miséria; fome;
retrocesso social, cultural e económico. E se ainda não tínhamos percebido bem
também ficámos a saber o que significa neoliberalismo e que contrariamente
àquela estória do pragmatismo político as ideologias estão bem vivas ainda que
escondidas e vestidas de forma angélica.
2. Mas se o empobrecimento é a estratégia global para o país,
espantosamente realizada pelo próprio governo da Nação, a verdade é que não
parece que tenhamos feito, aqui por Coimbra, o necessário trabalho de casa na
contabilização das consequências para a nossa cidade e para o nosso município
dessa estratégia e dos estragos duradouros que vai provocar.
Uma cidade que vive dos serviços, em particular na área do
ensino e da saúde, que vê a ser canibalizados a toda a brida, bem como a
diminuição da massa salarial dos seus ativos e as reformas dos seus aposentados
e reformados, e que não consegue ter investimento infraestrutural do Estado,
não pode deixar de arrancar os cabelos de desespero e de frustração.
Coimbra talvez tenha vivido sempre “bem de mais” e por isso
vive uma indiferença suicidária, mas veja-se com atenção os dados relativos ao
poder de compra concelhio - IpC do INE – recentemente publicados e atente-se
que o valor relativo a 2011 é já bastante inferior a 2000 e decerto será
assustadoramente mais baixo nos próximos anos.
O ano da morte de Nelson Mandela ficará no calendário
marcado como um ano de desgraça para Coimbra, em particular pelo acelerar de um
processo de anorexia económico-financeira, para o qual não nos vejo preparados
nem tão pouco despertos.
(Artigo publicado na edição de 19/12/2013 do Diário de
Coimbra)
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