quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Os PASSOS DO PAF



O PAF (Portugal à Frente) mais do que uma coligação é o embrião de um novo partido. Já tem bandeira, uma prática política de legislatura reveladora de uma ideologia consagrada em que não se distingue um ministro PSD de um ministro CDS e uma sintonia estratégica reveladora de um grupo coeso.

Os únicos entraves a uma aceleração ao processo formal de constituição são alguns sociais-democratas ainda existentes no PSD, sobretudo os seus autarcas, e o temor de uma derrota eleitoral. Quanto ao aprisionado CDS, com todas as suas bandeiras autónomas desfeitas, com minguados apoios no terreno e com um líder descredibilizado, cuja motivação para o combate político se resume à tentativa de conseguir um cargo internacional, porque há por aí uns rabos-de-palha e é impensável que um ministro irrevogável venha a integrar um novo governo, a questão resolve-se em três tempos.  

Esta será uma das reformas estruturais do nosso sistema partidário, sonhada há muito por alguns, cujo ritmo de desenvolvimento dependerá das próximas eleições. Uma eventual vitória do PAF nas legislativas, que seria a sorte grande do atual pessoal político do CDS, seria o fim do PSD, porque o PAF não tem nada de social-democrata como Passos Coelho teve o cuidado de demonstrar, sem escrúpulo mas cuidadosamente, durante a sua parceria governamental. 

O PAF é a direita reorganizada, professando um estranho neoliberalismo, que encontra paralelo no socialismo chinês. 

Quando António Costa assume a possibilidade de convidar a antiga presidente do PSD Manuela Ferreira Leite para um governo chefiado por si, face à sua professada fé social-democrata e a contestação às políticas do governo, não deixa de ser sintomática a quase ausência de reação da direção daquele partido. Expurgar os empecilhos social-democratas do universo da coligação é um objetivo não explícito mas importante para o futuro pafapiano.

Estamos, portanto, perante uma reorganização macro do nosso quadro partidário e esse é sem dúvida um aspeto particularmente interessante das próximas legislativas que vai ter o subsequente desenvolvimento nas presidenciais. Presidenciais que o PAF está a conduzir com o máximo cuidado, porque o seu candidato ideal, o candidato emblemático, que mereceria o seu apoio entusiástico seria, sem dúvida, o até agora indisponível Durão Barroso.

Era a cereja no topo do bolo. Um ex-maoísta do Clube de Bilderberg. 

(Artigo publicado na edição de 27 de agosto de 2015, do Diário de Coimbra)


quinta-feira, 13 de agosto de 2015

COIMBRA CIDADE DA MÚSICA



Em Coimbra há uma tão grande profusão de ideias para salvar a cidade que já se torna despiciendo, para não dizer ridículo, estar a estafar o bestunto com a matéria. Mas perdoe-se-me a teimosia, para não dizer a ousadia, de voltar ao mesmo ainda que correndo o risco de vir dizer coisa já pensada ou dita por alguém que sabe muito mais do salvamento de cidades do que eu.

Andava, por estes dias, à procura de uns criativos competentes para elaborarem cartazes quando me deparei com a referência à criação pela UNESCO de uma Rede de Cidades Criativas, contemplando vários pólos de criatividade entre os quais a música. 

A música chamou-me a atenção, não só porque é uma companheira diária e imprescindível, mas também porque tem uma expressão muito própria na nossa cidade. Mais, a música nos seus mais variados géneros e expressões foi, é e tenderá a ser um pilar fundamental da vida cultural da cidade, afirmação que me parece ser pacífica e não merecer contestação de quem quer que seja. 

Acresce que há novos equipamentos públicos, bem como espaços privados, de promoção de música que nos deixam antever um crescimento exponencial de iniciativas musicais nos próximos tempos, levando-a a assumir-se como um anjo redentor e transformador de alguns espaços urbanos em crise. A música pode assim ser um elemento agregador de uma agenda coletiva tendente à dinamização da atividade cultural, social e económica do Município. 

Descobri, ainda, que fazem parte da Rede de Cidades Criativas, no tema Música, nove cidades: Bolonha, Sevilha, Glasgow, Gent, Bogotá, Brazaville, Hamamatsu, Mannheim e Hannover – o que, diga-se, não parecem más companhias.

Acrescentarão alguns leitores, com ironia, que também por aqui há muitos “músicos.” Não sou eu que os contradigo, mas acreditem que, para além desses em que estão a pensar, há realmente aqui muitos e bons músicos, dos verdadeiros, que podem sustentar com sucesso um projeto como este, sem grandes custos e com uma perspetiva universalista que se coaduna na perfeição com o ADN da cidade. 

Elaborar uma candidatura e propor à Unesco que Coimbra integre a Rede de Cidades Criativas na área da Música, parece-me poder ser consensual, não ser difícil e vir a ser extremamente compensador em termos culturais, sociais e económicos. Seria uma composição fácil e inteligente, suscetível de ser executada por uma grande orquestra. 

Porque, contrariamente ao que se apregoa, o tempo de férias é um bom tempo para reflexão, deixo à consideração esta ideia, na expectativa de que por um qualquer acidente possa ser considerada pelos “maestros” da cidade.

(Artigo publicado na edição de 13 de agosto de 2015, do Diário de Coimbra)

quinta-feira, 30 de julho de 2015

AGRADECIMENTO



Para qualquer líder partidário a elaboração de listas é sempre um enorme problema. Nestes momentos lembro-me do tio Joaquim que tendo passado parte do dia a tomar conta do neto exclamou, entre o aliviado e o cansado, quando a tarefa foi dada por extinta: “É pior do que tomar conta dum saco de pulgas”.     

Para quem assiste são momentos empolgantes em que se desfazem mitos urbanos e outros, tanto mais porque, tendo a política tão má fama e sendo o serviço público tão exigente, fica-se surpreso com a profusão de generosos interessados em nos representar e defender os nossos legítimos interesses. 

É que ser deputado, contrariamente ao que muitos pensam e dizem, não é pera doce. Primeiro há um calvário a percorrer para chegar a candidato, em que se cria meia dúzia de amigos e um rodízio de inimigos e depois, logo no dia em que se é eleito, mesmo antes de ser empossado, o pobre do deputado adquire uma série de defeitos, de vícios e de perversidades que transtornam qualquer mortal. Há adjetivos, com que nem sonha, que passam de imediato a fazer parte do seu currículo, sem esquecer que nunca mais pode ir incógnito ou sossegado a qualquer lado e que tem de engolir frequentemente, com um rasgado sorriso e sem poder ripostar, alguns piropos dignos de belzebu.

Iniciadas funções, desde a fila em que se senta, ou é mandado sentar, até ao vestido ou ao fato e gravata que usa, tudo é reparado, sujeitando-se, ainda, ao violento exercício de ter de conviver diariamente com os inimigos do seu grupo parlamentar, que lhe disputam espaço e protagonismo, e de engolir as orientações do líder parlamentar que lhe ordena como votar.

Mais, tem de ter um carro de boa gama, vestidos ou fatos a condizer, gravatas vistosas, cara sem rugas e cabelo bem penteado. Sujeita-se frequentemente a problemas articulares a nível do pulso, por andar longas horas de copo gelado na mão em cocktails, após o que vai ter de ir comer a qualquer lado, fora de horas, para sobreviver. A qualquer lado não é bem assim. Tem de ir a um restaurante da moda comer um petisco gourmet, com um ar bem-disposto e a transpirar vitalidade.

Nos fins-de-semana há sempre uma festa ou uma romaria obrigatória e uma nova promessa para fazer, para além das desculpas que tem de preparar para as promessas não cumpridas. E no fim do mandato, só tem uma certeza: é a de que o número de amigos diminuiu proporcionalmente ao crescimento do número de inimigos.

Para ser deputado é necessário, sem réstia de dúvida, ter vocação de mártir e por isso quero aqui deixar o meu público agradecimento a todos os que se propõem, tão renhida e entusiasticamente, ao suplício de me representar.   

(Artigo publicado na edição de 30 de julho de 2015, do Diário de Coimbra)

quinta-feira, 16 de julho de 2015

INCOMODIDADE DESNECESSÁRIA.



Sei, por experiência própria, a distância entre o muito de substantivo e relevante que se decide nas reuniões da Câmara de Coimbra e aquilo que vem a público. Aliás qualquer autarca, com um mínimo de experiência, aprende a conviver com esta realidade. Estranha-se, por isso, ao ler os relatos das reuniões da Câmara, a repetição de uma moléstia que tão nefasta foi em anteriores mandatos. 

Há repetidos episódios de crispação e acrimónia, entre membros do executivo ou com munícipes, que são um inesperado déjà vu e que geram óbvio desconforto nos cidadãos. Por quê voltar a tomar o mesmo veneno sabendo quanto isso debilita os protagonistas e faz realçar o acessório em detrimento do essencial?

Para mais, tendo presente a enorme taxa de abstenção nas eleições autárquicas, há necessidade de um redobrado esforço para reganhar os cidadãos no interesse e no empenhamento cívico, com o objetivo coletivo de engrandecimento da cidade. 

É evidente que nem sempre é fácil suportar incompreensões e pequenas provocações mas isso faz parte do jogo democrático e o grande mérito está em conseguir evitar que futilidades diminuam e “apaguem” as boas decisões e os bons projetos.

A transposição de um certo ponto de equilíbrio no combate político e o assomo de humores pessoais no exercício de funções de representação dão invariavelmente mau resultado e criam barreiras desnecessárias levando a um estado de confusão e de desânimo que a ninguém aproveita. 

Não há, portanto, necessidade de complicar um trabalho à partida difícil, antes pelo contrário, o que se espera é a capacidade de arredondar arestas e de encontrar saídas para os bloqueios e os obstáculos que vão sendo colocados no nosso caminho. 

Acrescente-se, ainda, que há um problema de sintonia e de integridade global que é imperioso garantir como condição de afirmação e respeito geral, entre aquilo que é a cidade e o que ela representa e o seu governo. É preciso não esquecer que face a tudo o que a fantástica Coimbra foi, é e pretende ser é exigido um elevado perfil ao seu principal centro de poder local democrático.

Não sendo este um assunto fácil de abordar é contudo essencial refletir sobre ele e talvez o período de férias – um tempo mais relaxado e distendido –, permita a serenidade de análise e o ajustamento de práticas, tendo presente aquilo que Benjamin Franklin ensinou: “Os homens são criaturas muito raras: metade censura o que pratica; a outra metade pratica o que censura; o resto sempre diz e faz o que deve.”
 
(Artigo publicado na edição de 16 de julho de 2015, do Diário de Coimbra)

quinta-feira, 2 de julho de 2015

ASTRÓNOMOS AO PODER, JÁ!



Como resolver a questão europeia quando nos estamos a ver gregos com tanta confusão e desinformação, e em que o único valor em causa é o dinheiro? Confesso que não sei e estou cansado de não saber. Peço, imploro mesmo, a algum estadista, que esteja em reflexão nalguma Cartuxa, que, por favor, apareça e que unja com uma pitada de sabedoria os políticos europeus para que termine este eclipse de bom senso e de esperança.

Enquanto este sábio não aparece e num esforçado exercício de procura conclui que a solução está na entrega do poder aos astrónomos. Tenho dos astrónomos uma imagem de pessoas positivas, que fazem coisas por gosto e que, com os pés na terra, têm os olhos virados para o céu. 

Depois, os astrónomos também me parecem pessoas felizes, que passam muito tempo em silêncio, em profunda e metódica observação, à procura de respostas para a compreensão do mistério da vida ao contrário de uma rapaziada que se compraz em preconizar soluções de sofrimento e morte. Além disso não me parece que profissionalmente os astrónomos façam mais ou menos investigação em função dos dividendos que possam obter. Não acredito que recebam mais por uma galáxia do que por um planeta anão. 

Aliás, os próprios planetas anões implicam uma candidatura, como é o caso dos dois objetos transneptunianos, que têm a designação provisória de 2013 FY27 e 2013 FZ27 e que ainda não passam de candidatos a planetas anões.
Pois é, os astrónomos não brincam em serviço, querem certezas certas e não se deixam enganar com brilhos ou trajetórias ilusórias. Também são eles que sabem distinguir, com meridiana certeza, um meteorito de um planeta ou de um satélite. 

Considerem, portanto, como estas capacidades de identificação seriam importantes na observação dos políticos que nos aparecem sob os mais diversos disfarces, com santas auras, grávidos de frases sonoras, de posturas majestáticas e de impecáveis gravatas, devidamente orientadas por empresas de marketing, e os dissabores que nos evitariam.   

Se os líderes europeus fossem astrónomos não teríamos seguramente de suportar esta enxurrada diária de disparates, fruto de quem parece apenas conhecer a constelação do caranguejo e se orienta pelos signos do zodíaco.

Mais. Pensem quem é que verdadeiramente percebe de buracos negros. Obviamente os astrónomos. E não será que neste momento não estamos na Europa perante um enorme buraco negro económico, social e político!? 

Por tudo isto: astrónomos ao poder, já! 

(Artigo publicado na edição de 2 de julho, do Diário de Coimbra)