Houve
um tempo em que se reclamava por choques, o choque fiscal é um
exemplo, fazendo crer que era através de um ação rápida, forte e
determinada que seria possível resolver reais ou fictícios
estrangulamentos na vida económica, social ou política.
Hoje,
de sopetão, temos aí um choque vírico que assumiu a forma de
pandemia e nos remete para uma guerra biológica para a qual não
estávamos preparados.
É
verdade que os tempos que vínhamos vivendo eram politicamente
estranhos e socialmente confusos, mas nada fazia prever que a tolice
e fanfarronice trumpiana, somada à tropical bolsonarite e à
despenteada boris-brexit, sem esquecer tantas outras maleitas
ditatoriais e de incompreensível violência e sofrimento humano, nos
poderiam conduzir à presente quarentena universal.
Mas
se estamos angustiados e em estado de choque com as consequências
negativas do Covid-19, tanto mais que ele para além das graves
consequências para a saúde humana, também tem tido um efeito que
nos remete para o deus Jano da antiguidade clássica, um deus de duas
caras. Por um lado sentimos a enorme generosidade e coragem de tantos
- sejam os profissionais da saúde, sejam de tantas outras profissões
-, que trabalham permanentemente com risco permanente para a sua vida
para que tantos outros, a outra face de Jano, possam no conforto e na
ignorância criticar sem conhecer, lançar boatos sem escrúpulos e
acusar sem fundamento.
A
este respeito, porque temos tempo para a leitura e perante tantos
exemplos que vão surgindo, merece voltar ao clássico Carlo M.
Cipolla e às suas “Leis Fundamentais da Estupidez Humana”, em
que nos ensina que: “Cada um de nós subestima sempre e
inevitavelmente o número de indivíduos estúpidos em circulação.”
É
nestes momentos que verdadeiramente se conhece a natureza humana e é
também nestes momentos que se conhece a fibra de uma comunidade e de
um país, assim como é perante circunstâncias desta magnitude e
importância que se percebe a verdadeira inteligência coletiva para
enfrentar os problemas e tirar ensinamentos para o futuro, porque vai
haver futuro. Um futuro melhor.
No
isolamento social a que somos compelidos, por boas razões,
aproveitemos para refletir serenamente sobre o nosso modo de vida,
bem como todos os aspetos da nossa organização social e política,
retirando daí os múltiplos ensinamentos que o choque vírico a que
estamos a ser sujeitos nos pode dar, sem nos esquecermos de nos
prepararmos para o dilúvio de ferozes críticos de tudo e de todos
que inevitavelmente vão aparecer, bem como dos geniais salvadores
que vão sair das suas tocas para nos explicarem o que
verdadeiramente deveria ter sido feito.
Como
em quase tudo na vida os piores momentos podem servir para aprender e
melhorar. Aproveitemos, por isso, com este dramático choque vírico,
para aprender a resistir ao vírus da maledicência, da mentira e da
estupidez e preparamos o dia seguinte com mais humanidade, mais
solidariedade e mais fraternidade.
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