quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

UM GRANDE 31



No seu barómetro anual, acabado de publicar pela Transparência Internacional (www.transparency.org), sobre a perceção da corrupção no sector público, Portugal aparece no 31.º lugar, entre 175 país. Se é uma boa ou má classificação depende da perspetiva, mas que é um lugar simbólico lá isso é, porque a corrupção é sem dúvida um grande 31. Claro que, para uma correta compreensão deste ranking, é importante conhecer as metodologias utlizadas e não ficar pela enunciação genérica que é excelente para título de jornal mas de difícil entendimento quando, neste país das cunhas e de brandos costumes, se fala permanentemente e em alta voz da corrupção. 
 
Por mim, devo confessar mais uma vez, que sou um homem de sorte porque lendo e ouvindo tantas e tão variadas acusações de corrupção quando distraidamente no espaço público - seja no autocarro, no comboio ou no café – oiço as conversas dos meus vizinhos ocasionais nunca, mas nunca, os ouvi confessarem qualquer ato menos correto, o que me leva a concluir pela minha boa sorte dado que os malandros e os corruptos viajarão noutro autocarro, noutra carruagem ou estarão a saborear a sua bica, que irá ser paga com o ignominioso dinheiro obtido de forma nada transparente, noutro café ou noutra esplanada.

Por outro lado confronto-me frequentemente com o azar de ver, no momento seguinte, acusadores e mesmo “juízes” cuja opinião já transitou em julgado, sobre terceiros a quem acusam de corruptos impenitentes, a desbarretarem-se e a defenderem os réus que tinham condenado, quando se cruzam com eles ou obtém aquele pequeno favor que tão criticável era quando concedido a outro.

A questão da corrupção é sem dúvida complexa e o mais chocante é o envenamento dos espíritos feito pelos verdadeiros corruptos que através da generalização, se banqueteiam tranquilamente, em benefício próprio, com informações privilegiadas, subornos, etc., prejudicando aqueles que enchem a boca com a corrupção mas que são incapazes de a identificar e denunciar devidamente. Compare-se o mundo das acusações diárias de corrupção e as condenações judiciais que são tão raras que até duvidamos das estatísticas, parecendo que os números conhecidos até foram corrompidos. 

O “jogo da corrupção” é, sem dúvida, um jogo difícil, hoje mais do que nunca, muito por força de uma cultura da imagem em detrimento da substância, do respeitinho pelo senhor da bela gravata ou carro de topo de gama, da ausência de sansão social efetiva perante a cunha e o amigável desenrascanço, tudo isto adubado por imprensa tabloide e uma utilização perversa das redes sociais.

Pois é, temos aqui um grande 31 que mais do que combatermos andamos a maquilhar com pseudo propostas e tonitruantes declarações de intenção. É que no nosso “paraíso perdido” houve sempre uma cadeira, em lugar de destaque, para a Dona corrupção. 

(Artigo publicado na edição do Diário de Coimbra de 4.12.2014)

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