quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

DEAR MR. EDWARD SNOWDEN



1. Tomo a liberdade de o incomodar com um pedido de ajuda. Escrevo-lhe porque acredito que os amigos russos que zelosamente o guardam, lhe facultarão correspondência pessoal mesmo que lhe seja dirigida desta forma. Aliás, deve haver para aí uma dezena de serviços de informação que me começaram a rastrear - com os múltiplos satélites que têm a função de espiar as nossas pobres vidas -, desde o primeiro instante em que escrevi o seu nome no processador de texto, o que devo confessar me dá um certo gozo. Com efeito é um privilégio para um terrorista impossível, residente numa jovem freguesia de Coimbra, merecer a mesma atenção que o Papa Francisco, a chanceler Merkel, o presidente Obama e toda a rapaziada que por esse mundo fora se entretém a usar o poder, a contar dinheiro, a vender armas, ou a congeminar o envio de mártires para o paraíso. Venho, assim, com a presunçosa convicção de que lerá esta escrita, pedir-lhe que nos faculte algum do “material” coligido pela sua antiga entidade patronal, a National Security Agency (NSA), e de que será possuidor como “seguro de vida”. É coisa simples. Mesmo irrelevante para si. Faça-nos chegar algumas das transcrições das conversas havidas entre políticos e empresários do meu país, nos últimos anos. Claro que não se pede tudo, apenas acordos de partilha de poder, negócios do Estado com a banca, estratégia de alienação de ativos públicos, coisas destas. Apenas o que seja essencial para percebermos como negociaram a crise que nos espetaram e como acordaram, entre si, a partilha de despojos.

Acredite que lhe ficávamos muito gratos não só porque ajudaria a salvar muitas almas que vivem angustiadas com vontade de se denunciarem e que não o podem fazer mas, sobretudo, porque precisamos, urgentemente, de desmascarar um conjunto de “artistas” instalados em nichos de poder e de influência, para conseguirmos caminhar no sentido da moralização da nossa vida político-partidária tendo em vista a subsistência do regime democrático, tanto mais que já dissemos adeus a muito do essencial do estado social que, vai fazer 40 anos, começámos a construir. 

2. Já agora, faculte-nos também qualquer coisinha sobre a vida partidária de Coimbra. Também merecemos algum divertimento de âmbito local. Pelo que se ouve as disputas partidárias internas devem ser um manancial de informação sobre a instrumentalização, manipulação, guerrilha smartphónica, natalidade exponencial de fichas de militantes, etc. Não é justo que sendo esta apelidada de Cidade do Conhecimento vivamos na ignorância e tenhamos de nos contentar com o prato dos ossos para rapar - petisco bom mas insuficiente para compreendermos a riqueza da culinária local. 

Por fim, meu caro Edward, não se preocupe com o segredo de justiça nem com essas coisas das escutas telefónicas até porque sabe quem as faz e quem divulga os nacos que lhe interessa, dado que é perito na matéria e conhece-os a todos, não é verdade!? 

PS: Mesmo que saiba, apesar de não ser do seu tempo de analista da NSA, pede-se-lhe encarecidamente que não revele onde está o “Guião para a Reforma do Estado”, é que esse é mesmo segredo de estado.

(Artigo publicado na edição de 16 de Janeiro de 2014, do Diário de Coimbra)

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