Diz-se
que num barco que se afunda não há ateus, mas apesar de não ser
este o caso peço que me autorizem uma prece. Talvez seja uma prece
desajeitada e não consiga que qualquer divindade me oiça, mas aqui
fica o registo.
Sem
qualquer certeza de que o Covid-19 se retire nos tempos mais
próximos, tenho, no entanto, a certeza de que a todo o momento vai
irromper por tudo quanto é sitio um cacharolete de génios a dar
conta dos erros e das insuficiências dos decisores técnicos e
políticos, quanto à forma como nos conduziram no enfrentamento da
pandemia.
Muitas
das criticas serão justas, outras não passarão de sofismas e
muitas terão motivações que não consigo nem quero descortinar.
Mas, seja como for, o que acontece é que estamos a sair exaustos de
um tempo inesperado e ingrato que nos tirou o fôlego e o sorriso e,
por isso, precisamos de respirar.
Precisamos
de voltarmos a ser humanos, nem anjos nem demónios, simplesmente
seres humanos com belos defeitos e tristes virtudes, que precisam de
voltar a viver com sonhos, esperanças, tristezas e alegrias, e, por
isso, o pedido é de que nos deixem em paz e não nos infernizem as
estações do ano que ainda nos restam.
Sabemos
que há sempre quem saiba tudo, à posterior claro, e que adora
passar-nos um atestado de ignorância por coisas que devíamos ter
feito porque fazem parte das profecias de Nostradamus, que tem
vacinas contra todas as incompetências dos competentes e que sabe o
tipo e número de rolos de papel higiénico necessários para
aguentar uma pandemia.
É
óbvio que temos de saber tirar lições, e não são poucas, desta
experiência excecional que estamos a viver. Lições individuais e
coletivas. Mas precisamos de um tempo de reflexão porque a passagem
de uma “vida caótica engendrada pelo tecno-capitalismo”, como
José Gil a caracterizou, a uma nova normalidade não é tarefa
fácil.
Temos
de reconstruir um modelo de relação de humanidade; lançar um novo
e diferente olhar para o que nos rodeia; distinguir o essencial do
acessório; estabelecer uma nova hierarquia de valorização da
atividade profissional humana; e garantir, de imediato, que não há
hesitações em fortalecer o nosso Serviço Nacional de Saúde.
Temos,
também, de saber valorizar o que de bom temos vindo a fazer e de
resistirmos à velha tentação lusitana de contestar os nosso
méritos e de valorizar os alheios como se tivéssemos condenados a
ser os patinhos feios da humanidade.
Mais
ainda, temos de combater a tentação de institucionalizar qualquer
pensamento único, assumindo cada um de nós com clareza o seu
pensamento e a sua agenda.
Por
tudo isto é fundamental, que neste mundo ilógico e perante as
nossas inseguranças, evitar os génios geniais que vão aparecer em
fila para nos esmagarem com as suas verdades e certezas, e, por isso
peço, com humildade: Livrai-nos deles, Senhor!
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