quinta-feira, 10 de março de 2016

UMA CIDADE PERDULÁRIA



Coimbra é uma cidade de desperdício, uma cidade perdulária. Uma cidade de desperdício daquele que é sem dúvida um dos maiores e mais imprescindíveis bens ao seu progresso e desenvolvimento – o desperdício da sabedoria e da experiência.

Com uma acumulação de séculos de capital intelectual, obra de sucessivas gerações de académicos, cientistas, investigadores, artistas e artesãos e de mulheres e homens bons que lhe votaram uma dedicação permanente, Coimbra não tem sabido aproveitar e fazer render esse fantástico património.
Uns atrás de outros vão cessando a vida ativa sem que o seu capital de sabedoria e experiência seja aproveitado em benefício de uma cidade que amam e a quem poderiam dar com satisfação, sem exigências de pagamento ou compromissos espúrios mas com total liberdade, contributos determinantes para evitar erros e más decisões e sobretudo perspetivas de futuro pela capacidade de lerem os pequenos/grandes sinais que só a sabedoria ensina a conhecer.

Fica-se jubilado, passa-se a aposentado ou reformado e acabou-se. Num determinado dia e hora deixou-se de contar e tudo aquilo que acumularam e que é intransmissível fica no limbo sem proveito e sem aproveitamento.

Conscientes de que os problemas surgem inopinadamente e que há uma procura de remediar as coisas mais urgentes, acabamos por nos concentrar em questiúnculas sem mérito e sem interesse e não somos capazes de identificar os problemas-chave, o que poderia ser evitado e ultrapassado se houvesse capacidade de ouvir e acolher o conselho e as sugestões daqueles que possuem a preciosa acumulação de conhecimentos e de saber e que estão confinados a um inconcebível esquecimento.

Organizações, cidades e países mais desenvolvidos criaram espaços de reflexão, uns chamados think-tanks em que contam com a participação de stakeholders, como para aí se diz em jargão tecnocrático, conseguindo assim decisões melhores e de mais larga visão.

Pois é, digam-me que cidade deste país com idêntica dimensão tem disponível tanto ilustre cidadão, detentor de conhecimentos e de sabedoria, sem interesses particulares, e suscetíveis de serem envolvidos em reflexões prospetivas e de interesse coletivo, como Coimbra. 

Coimbra é, sem dúvida, uma cidade que não tem sabido aproveitar esta enorme riqueza, que poderia ajudar a definir desígnios de futuro e sonhos de vida coletiva, com inteligência e sem a tacanhez dos pequenos e efémeros poderes que a vão minando. 

(Artigo publicado na edição de 10 de março, do Diário de Coimbra)

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