A
ausência de Coimbra no repúdio pelo ataque terrorista em França e o que ele
representou veio, mais uma vez, demonstrar a incapacidade de reação coletiva e
de protagonismo daquela que, por vezes, ainda pretende ser a terceira cidade do
país.
Quando,
por esse mundo fora, as cidades vieram para a rua gritar e defender a
liberdade, por aqui apenas se teve nota de uma iniciativa de estudantes do
curso de jornalismo a que se associaram meia dúzia de cidadãos, numa Praça 8 de
Maio vazia e frustrada. Foi pena porque nestes dias de afirmação generalizada
Coimbra expressou alheamento ficando-se por um: “Qui est Carlie?”
Mas,
este episódio cada vez mais convence de que terá havido um acordo com um
qualquer demónio que levou Coimbra a vender a sua alma a troco de um quotidiano
pachorrento e de uma existência sem chama. Sem nervo, politicamente pobre e
frágil, não encontra causas que a motivem nem ofensas a princípios basilares
que a espevitem.
Infelizmente
são quase exclusivamente as cervejeiras que a fazem vir para a rua, desfilar
num ritual baconiano cada vez mais desbragado, sem cagança nem pilhéria.
Numa
cidade universitária com pergaminhos, onde existe saber e serviços altamente
qualificados e sofisticados, sente-se a dramática ausência de iniciativa e uma
convicta expressão cívica que permita combater o país cada vez mais bicéfalo. O
país duma Lisboa e de um Porto que se vão entendendo e repartindo entre si
mais-valias e investimento.
Quando
se desejava o saudável equilíbrio do desenvolvimento do país, garantindo uma
maior coesão económica e social, o que tem vindo a acontecer é, sem margens
para dúvidas, um alheamento de Coimbra na assunção daquilo que é a sua vocação
natural - ser a capital regional do Centro. Sendo uma tarefa difícil e que
exige inteligência, paciência, persistência e golpe de asa, torna-se evidente que
há pequenas/grandes coisas que não podem deixar de ser assumidas com
oportunidade e fibra.
Falta
“alma” a Coimbra e então desde o final do século passado esta verdade tem
assumido uma maior evidência. Como razão para esta queda gradual e constante, no
ranking da importância política, não será estranho o facto de a nossa última
figura tutelar, que o poder central ainda respeitava, ter desaparecido há duas
décadas. Pois é, vai fazer 20 anos que ficámos sem Torga. Torga que via da
Portagem o país e o mundo e que com a sua presciência e coragem dizia o que era
preciso dizer.
Que
falta nos faz Torga para nos ajudar a descobrir o caminho do futuro e a
esclarecer quem é Charlie.
(Artigo
publicado na edição de 15 de janeiro 2015, do Diário de Coimbra)
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