A aprovação no recente Conselho Europeu das verbas destinadas ao combate à crise pandémica e o investimento na recuperação da Comunidade Europeia representam, para o nosso país, um enorme bolo que importa sabermos apreciar e deglutir com cuidado.
Para alguns – em especial para os que não gosta da União Europeia, mas que dela usufruem sem rebuço – o bolo é pequeno e não gostam de alguns ingredientes pelo que, no primeiro momento, contestarão os valores ainda que logo a seguir, como é hábito, se batam pela conquista da maior fatia.
Concomitantemente o vasto painel de comentadores e analistas vão esmagar-nos com prédicas eloquentes e inundar-nos com “estudos científicos”, que somados às “fake news, tão em voga nas redes sociais, nos vão exigir um superior esforço de procura de conhecimento e informação fidedigna para percebermos o que verdadeiramente está em causa.
Estamos, portanto, enquanto cidadãos, confrontados com a necessidade dum enorme trabalho de clarividência para acompanharmos o que vai acontecer com a utilização da “pipa de massa”, que vai ser colocada ao nosso dispor.
Mais, é-nos exigido, a todos nós, uma avaliação séria e permanente, despida de partidarite, que não tolere atropelos éticos e formais e sobretudo que, de uma vez por todas, não permita desculpas e imponha sanções sociais, acabando com aquele proverbial encolher de ombros e quase elogioso: “ele é que é esperto”, quando assiste a manobras habilidosas com ganhos indevidos, como tantas vezes aconteceu com a utilização de dinheiros comunitários.
O atual governo, esse, ficará na história, para o bem ou para o mal, pela capacidade que tiver para garantir a transparência de todo este processo, bem como pelos meios claros de escrutínio que disponibilizar aos cidadãos e o empenhamento numa luta sem quartel à corrupção e aos interesses espúrios que sempre surgem nestas ocasiões.
É, por isso, necessária uma conjugação de esforços entre os poderes públicos e os cidadãos para enfrentar os ladrões do nosso futuro, que estarão à espreita – não tenhamos dúvidas – armados de todos os truques e com a matéria estudada sobre as melhores formas de contornar todos e quaisquer mecanismos de controlo que possam vir a ser considerados.
É um combate histórico - que não permite desculpas esfarrapadas nem omissões comprometedoras, contra a corrupção e os mafiosos interesses latentes neste país -, que o governo e a sociedade civil são chamados a travar e que não podem perder.
Mas, para além deste contexto global, há também atos e omissões locais que importa ter presente.
Recentemente, apelei aqui que Coimbra fosse, no contexto do processo de elaboração pelo governo de um Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020-2030, rápida, exigente e ambiciosa a elaborar um plano para o Município e a apresentá-lo ao governo. Sugeri que o mesmo fosse elaborado no âmbito da Assembleia Municipal. Obviamente que esta sugestão não teve qualquer eco.
Assim, perspetivasse que vai acontecer o habitual. Outros municípios e outras cidades vão avançar rapidamente com a apresentação dos seus cadernos de encargos e daqui a algum tempo ouviremos, quando nos virmos ultrapassados e esquecidos, os lamentos e as recriminações por não termos feito nada.
É bom ter presente que estamos a falar da próxima década e que neste momento, por aqui, ainda estamos a resolver problemas e a fazer obras no espaço público que outras cidades europeias e mesmo nacionais, concluíram no século passado. Temos portanto um enorme atraso que temos de recuperar ao mesmo tempo que temos de fazer coisas novas, criativas e inovadoras para nos podermos afirmar.
Estamos, portanto, perante desafios que implicam atos e não permitem omissões, sob pena dum julgamento severo pelos vindouros, que não perceberão como não fomos capazes de aproveitar este bolo especial que nos está a ser servido e de garantirmos a nossa fatia a bem do futuro.